por Carlos Coelho
Na teoria dos físicos os nomes são complicados: energia potencial e cinética. Mas, bem grosso modo, o que faz um trenzinho de uma montanha-russa subir é um único fator, ele já caiu o bastante. Para Henrique Meirelles, o vagão que carrega a economia brasileira bateu no fundo do poço e, agora, sobe. “Passamos por um momento muito difícil quando o país enfrentou a maior recessão da sua história. O importante é que a recessão terminou”, decretou o ministro da Fazenda no fim de fevereiro.
Não foi a primeira demonstração de otimismo exacerbado. Mas, dessa vez, os sinais dão conta de que o impulso é, de fato, mais sólido. Se não levará o vagão de volta ao topo, pelo menos o tirará de uma posição desconfortável. O país está com inflação controlada, reformas essenciais parecem caminhar e vários indicadores mostram algum movimento na atividade econômica. O mercado, de acordo com o boletim Focus, aposta em crescimento de perto de 0,48% no PIB. Pouco, mas um alívio após dois anos de encolhimento.
"0,48% é a mediana do Banco Central para o Produto Interno Bruto do Brasil em 2017."
Tem quem esteja mais otimista. O Itaú Unibanco prevê retomada na ordem de 1%. “O fundo do poço foi o quarto trimestre do ano passado. Neste primeiro trimestre de 2017já vamos ver crescimento na ordem de 0,3% no PIB”, defende o economista do banco Felipe Salles. Entre os motivos para acreditar, há algo além da demanda: a indústria precisa repor seus estoques e isso vai movimentar a economia.
A produção industrial, aliás, é um indicador ainda dúbio, já que teve uma melhora significativa em dezembro de 2016, crescendo 2,3%, mas mostra quedas acentuadas e sucessivas nos acumulados. Ainda assim, índices setoriais mostram alguma reação, que deve aparecer neste trimestre. O país gastou mais eletricidade neste começo de ano, produziu mais papelão e teve mais carros nas rodovias – mostram que a indústria está com uma atividade mais intensa do que no fraco 2016.
É um movimento impulsionado por um cenário favorável. A inflação controlada dá força para uma redução mais acentuada na taxa básica de juros. Em fevereiro, ela foi a 12,25%. Otimistas acreditam em um dígito até o fim do ano, o que devolveria o patamar de 2013. E mais investimento, produção e compras.
Não são fatores isolados. Tem a expectativa de dinheiro injetado pelas contas inativas do FGTS, bons números da safra e alta dos commodities.
Uma pesquisa do Ibope Inteligência mostra que o brasileiro está mais confiante em 2017 em relação a 2016. 45% dos entrevistados se disseram mais otimistas com a economia neste ano.
Apesar disso, está longe de ser uma viagem tranquila. Alguns indicadores, como o da construção civil, ainda estão bem ruins. Para impulsionar a economia, o governo precisará emplacar suas reformas, como a da Previdência. Cumprida a tarefa de casa, há a incerteza do cenário internacional: será que o Brasil estaria preparado para o mundo mais protecionista de Donald Trump.
Não é o pior dos fatores. Este título quem leva é o desemprego, ainda com tendência de alta -- deve piorar em relação a 2016 e 2015. Para que a taxa de desemprego caia será preciso bem mais do que um crescimento de 0,5% -- economistas calculam algo em torno de 2% a 3%. Assim, a percepção real de melhora pode levar bem mais tempo do que a da frieza dos números. “O mercado de trabalho é o último vagão do trem. Enquanto a locomotiva se reergue, o mercado de trabalho ainda está em baixa” diz Sales. E, neste contexto, ainda há 12 milhões sentindo o incômodo frio na barriga da d escida.
Algumas políticas e conjunturas podem acelerar a retomada do crescimento
FGTS inativo:
Segundo o governo federal, os saques de contas inativas podem injetar R$ 41 bilhões na economia – embora os números do Relatório de Gestão do FGTS apontem para R$ 19,5 bi. Para o Ibre/FGV, este dinheiro poderá elevar em 0,4% o consumo no Brasil em 2017. Os saques começam neste mês.
Commodities em alta:
O mundo deu uma mãozinha para a economia brasileira neste começo de ano. As vendas de minério de ferro e petróleo cresceram nos dois primeiros meses do ano, levando a balança comercial brasileira a um patamar confortável. Uma projeção de consultorias ao jornal Valor Econômica aponta a melhora no índice de termos de troca (relação entre preços de exportação e importação). No acumulado de 12 meses até fevereiro de 2017 ficou em 8,2%; no mesmo período até fevereiro de 2016, era 3%.
Reposição de estoques:
Para o Itaú Unibanco, a indústria deve se aquecer mais por uma necessidade de repor os estoques, que não tiveram grandes alterações nos últimos dois anos, do que pela demanda em si. O banco aponta que isso poderá levar a um aumento no PIB de 2017 de 1%, uma estimativa mais otimista em relação ao Banco Central, que espera 0,48% de crescimento.
Safra recorde:
O Brasil deve produzir em 2017 um total de 221 milhões de toneladas de grãos, a maior safra da história do país. E isso movimenta toda a cadeia produtiva. Algumas análises, como a do Santander, apontam que a performance pode responder por metade do crescimento da economia brasileira neste ano. Também é um fator determinante na balança comercial.
Alguns índices não deixam dúvida de uma melhora no cenário econômico brasileiro. Mas outros apontam que o caminho pode ser bem mais lento do que se espera...
Meio cheio
Inflação:
O Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) mede a inflação oficial. E mostra que houve queda no acumulado dos últimos 12 meses já calculados, até janeiro de 2017: 5,35%. No acumulado do ano anterior, até janeiro de 2016, esse número era bem mais alto: 10,71%. Apesar disso, a inflação subiu levemente em relação a dezembro de 2016, quando o IPCA foi 0,30%. Só que está bem mais baixa se comparada a janeiro de 2016, quando o índice era 1,27%. A meta inflacionária para o ano é de 4,5%.
Venda de papelão ondulado:
Este índice mostra melhora na produção geral, já que a demanda do papel aumenta conforme a atividade na indústria. Cresceu com certa expressão nos últimos meses calculado: +3,3% em dezembro de 2016 e +5,5% em janeiro. A expectativa do setor é positiva.
Transporte rodoviário:
Mais caminhões nas estradas revela mais produção na indústria. O fluxo de veículos nas rodovias aumentou 1% em janeiro/2017 em relação ao mês anterior. Embora, no acumulado dos 12 meses, a retração tenha sido de 3,1% – tal número é explicado pelo péssimo desempenho de 2016.
Endividamento:
As famílias estão menos endividadas e, na teoria, podem voltar a tomar crédito. De novembro para dezembro, a relação entre estoque de crédito contratado e renda líquida no ano caiu de 42,4% para 42,13%. Em dezembro de 2015, na comparação de 12 meses, as famílias estavam mais endividadas: 44,55%.
Produção de veículos:
Está sendo impulsionada pela redução dos estoques e pelas exportações. Em janeiro de 2017, cresceu 17,1% se comparado a janeiro de 2016.
Meio vazio
Produção industrial:
Cresceu 2,3% no país em dezembro de 2016, comparado ao mês anterior. Mas os números apontam queda generalizada nos últimos meses. No acumulado de 2016, o recuo foi de 6,6%. Se comparar dezembro de 2016 a dezembro de 2015, houve pequeno recuo de 0,1%. A expectativa, no entanto, é de melhora nesta performance.
Índice de desemprego:
Para crescer, o país precisará empregar mais. A taxa de desemprego no trimestre encerrado em janeiro deste ano foi a 12,6%. Isso representa 12,9 milhões de brasileiros na rua. O número é pior em relação ao trimestre anterior, 11,8%, e em relação ao mesmo período do ano anterior, onde 9,5% dos trabalhadores estavam desocupados.
Construção civil:
A construção civil continua em crise ao analisar os números da venda de cimento – melhor medida para projetar a movimentação no setor. Janeiro de 2017 teve 2,5% a menos de cimento vendido se comparado a janeiro de 2016 – e este mês havia sido particularmente ruim, com queda de 21% em relação a janeiro de 2015. No consolidado de 12 meses, a queda nas vendas foi de 10,3%. A entidade espera retração de 5% a 7% em 2017.
Fonte: Gazeta do Povo, 6 de março de 2017.