A política de reindustrialização de Donald Trump entrou em crise. Dados divulgados pelo Departamento de Estatísticas Trabalhistas dos Estados Unidos (BLS) mostram que o país perdeu 78 mil empregos na manufatura no período de um ano encerrado em agosto, o pior desempenho do setor desde a pandemia de 2020.
O número contrasta com o discurso oficial da Casa Branca, que aponta o protecionismo e as tarifas como pilares da recuperação produtiva.
Desde janeiro, a indústria americana acumula queda líquida de 38 mil postos de trabalho. A produção industrial recuou 0,4% em agosto, e o investimento em novas fábricas caiu 6% no período de um ano até julho, segundo o BLS .
A recessão industrial ocorre em meio à explosão dos investimentos em tecnologia e reverte o impulso inicial da Lei dos Chips e Ciência de 2022, que havia dobrado o investimento em instalações de semicondutores até 2024.
O gasto com inteligência artificial, data centers e hardware de processamento cresceu 37% no primeiro semestre, e as importações de chips de última geração avançaram 64% no acumulado do ano. O governo tenta associar esses números a uma “nova era produtiva”, mas o contraste entre os setores revela uma mudança estrutural: os Estados Unidos produzem cada vez mais dados e menos bens.
Os efeitos das tarifas adotadas por Trump são visíveis. O aumento das taxas sobre aço, alumínio e insumos industriais encareceu custos de produção, corroeu margens de lucro e reduziu a competitividade de empresas que dependem de componentes estrangeiros. Montadoras como General Motors, Caterpillar e John Deere informaram prejuízos bilionários relacionados às tarifas e margens menores do que em qualquer momento desde a pandemia.
O emprego industrial total caiu para 12,9 milhões de trabalhadores, bem abaixo do pico de 19,5 milhões registrado em 1979. Apesar dos incentivos fiscais e da promessa de repatriar cadeias produtivas, o país continua a perder fábricas: o número de novas plantas abertas em 2025 foi o menor em quatro anos, segundo o Censo norte-americano.
A inteligência artificial, apresentada por Trump como a nova fronteira tecnológica dos EUA, segue o caminho oposto. O investimento em equipamentos de informática subiu 45% em relação a 2024, elevando o valor de mercado de empresas como Nvidia e Microsoft a patamares históricos.
No entanto, o crescimento da IA emprega poucos trabalhadores. Um centro de dados, que demanda mais de mil operários durante a construção, abriga apenas algumas centenas após inaugurado — muito abaixo de uma fábrica tradicional de automóveis.
Para analistas, o país enfrenta uma nova forma de desindustrialização: o capital produtivo migra para setores que concentram riqueza e geram pouco emprego, enquanto a economia real encolhe. Os empregos criados por políticas de proteção são superados pelas perdas decorrentes do aumento de custos e da retração da demanda.
Mesmo com a desaceleração, o governo insiste que os resultados são temporários. Em nota, a Casa Branca afirmou que “a reconstrução do domínio industrial americano levará anos” e que “as tarifas e os incentivos fiscais estão criando as bases para um novo ciclo de prosperidade”. Na prática, os indicadores mostram o contrário: menos investimento, menos fábricas e menos trabalhadores.
O contraste entre o boom da inteligência artificial e a estagnação das fábricas evidencia o fracasso de uma das bandeiras centrais do trumpismo. Enquanto o governo celebra o avanço digital, a base operária que sustentou a promessa de ‘fazer a América grande novamente’ volta a encolher.
VERMELHO