Suzana Poletto Maluf

Poucos momentos são tão desafiadores para o trabalhador quanto adoecer em razão do próprio trabalho.

Poucos momentos são tão desafiadores para o trabalhador quanto adoecer em razão do próprio trabalho. A rotina pesada, a pressão por metas, o esforço físico repetitivo ou a exposição a ambientes insalubres acabam, muitas vezes, gerando doenças que afastam o profissional de suas funções.

E quando isso acontece, surge uma dúvida muito comum: quem tem doença ocupacional tem estabilidade no emprego?

Muitos trabalhadores, ao retornarem do afastamento, enfrentam o medo de serem demitidos. E isso, infelizmente, não é raro.

O que muitos não sabem é que a lei protege quem ficou doente em razão do trabalho, garantindo estabilidade, indenizações e outros direitos que evitam que o trabalhador seja duplamente prejudicado.

Neste artigo, você vai entender de forma simples e direta quais doenças geram estabilidade, quando o empregador pode ou não demitir, quais são os direitos de quem teve doença ocupacional e o que fazer se a empresa não respeitar esses direitos. Acompanhe!

Pode demitir funcionário com doença ocupacional?

Em regra, não. O trabalhador que foi diagnosticado com doença ocupacional, ou seja, aquela causada ou agravada pelo trabalho, tem direito à estabilidade no emprego por 12 meses após o retorno do afastamento pelo INSS.

Isso significa que a empresa não pode demitir sem justa causa nesse período. Se o fizer, o trabalhador pode ser reintegrado ao emprego ou receber indenização equivalente ao período de estabilidade.

A demissão só pode ocorrer em duas situações específicas:

Por justa causa, quando há falta grave comprovada;
A pedido do próprio trabalhador, caso ele queira sair.
Afastamento por doença ocupacional tem estabilidade?

Sim. O trabalhador que fica afastado por mais de 15 dias e recebe o benefício auxílio-doença acidentário (código B91) do INSS tem direito à estabilidade de 12 meses após a alta médica.

Essa estabilidade é garantida pelo art. 118 da lei 8.213/91 e tem como objetivo dar segurança para que o trabalhador se recupere e retome suas atividades sem o risco de ser demitido logo em seguida.

É importante destacar que a estabilidade não depende do tipo de contrato de trabalho, valendo tanto para CLT quanto para empregados domésticos, rurais ou temporários.

Quais doenças dão estabilidade no emprego?

A estabilidade não depende de uma lista fechada de doenças, mas sim da relação entre a doença e o trabalho.

Ou seja, se a atividade exercida contribuiu diretamente para o surgimento ou agravamento da enfermidade, há direito à estabilidade.

Entre as doenças mais comuns que podem gerar estabilidade estão:

LER/DORT - Lesões por Esforços Repetitivos, como tendinite, bursite ou síndrome do túnel do carpo;
Hérnias de disco e lombalgias causadas por esforço físico contínuo;
Doenças respiratórias em quem trabalha exposto a poeira, fumaça ou produtos químicos;
Doenças mentais como depressão e síndrome de burnout, quando comprovadamente ligadas ao ambiente de trabalho;
Problemas auditivos causados por ruído constante sem proteção adequada.
A comprovação é feita por meio de perícia médica e documentos que demonstrem o nexo entre a doença e a função exercida.

Quais os direitos de quem tem doença ocupacional?

A legislação trabalhista e previdenciária brasileira garante uma série de direitos e proteções específicas para quem adoece em razão do trabalho.

A seguir, explicamos de forma simples e prática quais são esses direitos e como exercê-los.

1. Auxílio-doença acidentário (B91)

O primeiro direito é o afastamento remunerado pelo INSS por meio do auxílio-doença acidentário (código B91).

Esse benefício é concedido quando o trabalhador fica incapacitado temporariamente para exercer suas funções em decorrência de doença relacionada ao trabalho.

O benefício é pago a partir do 16º dia de afastamento (os 15 primeiros são pagos pela empresa).
Durante o período de recebimento, o trabalhador continua vinculado à empresa, mantendo seus direitos trabalhistas.
Ao final do afastamento, ele tem direito à estabilidade de 12 meses após o retorno ao trabalho.
É fundamental que o afastamento seja reconhecido como "acidentário" e não "comum". Só assim o trabalhador garante a estabilidade e os demais direitos previstos em lei.

2. Depósito do FGTS durante o afastamento

Um dos maiores diferenciais da doença ocupacional é que, mesmo durante o afastamento, o empregador continua obrigado a recolher o FGTS do trabalhador.

Isso ocorre porque o contrato de trabalho não é suspenso, e sim interrompido, o vínculo se mantém ativo.Esse detalhe faz diferença na hora de sacar o FGTS futuramente, pois o período afastado conta como tempo de trabalho.

3. Estabilidade no emprego por 12 meses

Após o retorno do afastamento, o trabalhador tem direito à estabilidade de 12 meses.

Durante esse período, não pode ser demitido sem justa causa. Se a empresa insistir em dispensar o funcionário, o trabalhador pode exigir:

A reintegração imediata ao emprego, com pagamento dos salários do período afastado; ou
Indenização substitutiva, equivalente ao tempo de estabilidade não cumprido.
Essa proteção é essencial para que o trabalhador possa se recuperar com segurança e retornar à rotina sem o risco de ser demitido logo após o tratamento.

4. Indenização por danos morais e materiais

Se a doença ocupacional foi causada por negligência da empresa, como falta de EPI - Equipamentos de Proteção Individual, jornadas excessivas, ambiente inadequado ou ausência de pausas, o trabalhador pode pedir indenização por danos morais e materiais.

Essas indenizações buscam compensar:

O sofrimento emocional e psicológico causado pela doença;
Os prejuízos financeiros, como gastos com tratamento, fisioterapia, medicamentos e redução da capacidade de trabalho;
A perda parcial ou total da capacidade laboral em casos graves.
Cada caso é avaliado individualmente, e o valor da indenização depende da extensão do dano e das provas apresentadas.

5. Conversão em aposentadoria por invalidez (aposentadoria por incapacidade permanente)

Em casos mais graves, em que a doença gera incapacidade total e permanente para o trabalho, o benefício pode ser convertido em aposentadoria por invalidez (atualmente chamada de aposentadoria por incapacidade permanente).

Essa conversão ocorre após nova perícia médica do INSS e garante ao trabalhador uma renda mensal contínua, sem prazo para cessação - até que uma nova perícia comprove eventual recuperação.

6. Pensão vitalícia paga pela empresa

Em casos mais graves, quando a doença ocupacional ou o acidente de trabalho gera incapacidade permanente para o exercício da profissão, o trabalhador pode ter direito a uma pensão vitalícia paga pela empresa.

Essa pensão tem caráter indenizatório e visa compensar a perda de capacidade de trabalho e o impacto financeiro causado pela limitação definitiva.

Ela pode ser:

Integral, quando o trabalhador perde totalmente a capacidade de exercer sua atividade; ou
Proporcional, quando há redução parcial da capacidade, mas o trabalhador ainda consegue desempenhar outras funções.
A base legal prevê que, quando um ato ilícito causa redução da capacidade de trabalho, o responsável deve pagar pensão correspondente à importância do trabalho para o qual a vítima se inabilitou.

Exemplo prático: um operador de máquina que perde o movimento de um braço em decorrência de acidente de trabalho pode receber pensão vitalícia proporcional à perda da sua capacidade profissional, paga diretamente pela empresa.

Essa indenização é independente dos benefícios pagos pelo INSS e pode ser cobrada judicialmente.

Por isso, ter um advogado especializado faz toda a diferença para orientar sobre cada direito, reunir provas e cobrar o cumprimento da lei, seja junto ao INSS ou na Justiça do Trabalho.

Quem tem doença ocupacional pode pedir rescisão indireta?

Sim. A rescisão indireta ocorre quando o empregador comete falta grave, tornando impossível a continuidade da relação de trabalho.

Se o trabalhador adoeceu porque a empresa não adotou medidas de segurança, negou afastamento médico, pressionou para voltar antes do tempo ou tratou com descaso o problema de saúde, é possível pedir a rescisão indireta.

Assim, o trabalhador pode receber todos os direitos como se tivesse sido demitido sem justa causa, incluindo o saque do FGTS, aviso prévio e seguro-desemprego.

O que fazer se for demitido no período de estabilidade

Se o trabalhador for demitido dentro do período de estabilidade, é importante não assinar nenhum termo de rescisão sem orientação jurídica. Os passos recomendados são:

Guardar todos os documentos: Atestados médicos, laudos, CAT - Comunicação de Acidente de Trabalho, comprovantes do INSS e termo de rescisão;
Procurar o sindicato da categoria ou um advogado trabalhista;
Entrar com uma ação na Justiça do Trabalho pedindo a reintegração ao emprego ou o pagamento da indenização correspondente ao período de estabilidade.
Na maioria dos casos, a Justiça reconhece o direito do trabalhador, principalmente quando há comprovação médica e documental da doença relacionada ao trabalho.

Papel do advogado para garantir que os direitos sejam respeitados

O advogado trabalhista e previdenciário é o profissional que atua tanto na parte administrativa (INSS) quanto na judicial, garantindo que todos os direitos do trabalhador sejam observados. Ele pode:

Analisar se a doença realmente se enquadra como ocupacional;
Acompanhar o pedido de auxílio-doença acidentário e o processo de estabilidade;
Reunir provas e documentos que comprovem o nexo entre a doença e o trabalho;
Entrar com ações judiciais para reverter demissões indevidas ou pedir indenizações.
Ter um advogado especializado é o que faz diferença entre perder o direito por falta de informação e garantir uma compensação justa pelo prejuízo sofrido.

A doença ocupacional é uma realidade que atinge milhares de trabalhadores brasileiros todos os anos. Além do impacto na saúde, ela traz insegurança e medo de perder o emprego justamente quando o trabalhador mais precisa de apoio.

Mas a boa notícia é que a lei garante estabilidade e proteção, e você não precisa enfrentar isso sozinho.


Suzana Poletto Maluf
Especialista em direito previdenciário, benefícios sociais e aposentadorias. @malufsuzana

MIGALHAS
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